.A ficção da política monetária
Enviado por luisnassif, sex, 03/02/2012 - 12:16
Coluna Econômica - 03/02/2012
Vamos retomar o tema da coluna de ontem.
Como funciona a política monetária:
1. A cada fechamento do dia, os bancos trocam reservas entre si para fechar a conta. A taxa de juros dessas operações é dada pelo CDI (Certificado de Depósito Interbancário) diretamente afetado pela taxa Selic, a chamada taxa básica da economia fixada pelo Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central).
2. Tornando o dinheiro mais caro no interbancário, pretende-se que a elevação de custo impacte a taxa de juros na ponta, aquela que vai para o cliente de banco.
3. Com a taxa mais cara, teoricamente o consumidor vai consumir menos, devido ao encarecimento de crédito, e a empresa vai comprar menos, devido à redução de estoques, reduzindo os preços. E vice-versa.
Vamos sintetizar o que foi exposto acima em um pequeno exercício de lógica:
1. As taxas de crédito ao tomador final impactam o PIB.
2. A taxa Selic impacta as taxas de crédito ao tomador final.
3. Logo, a taxa Selic impacta o PIB.
O ponto central é que a segunda premissa é incorreta: a taxa Selic não impacta as taxas do tomador final. Não impactando, seu impacto sobre o nível de atividade é zero, ou insignificante. Mas sobre as contas públicas é direto, desviando recursos de infraestrutura, investimentos e políticas sociais para os detentores de títulos públicos.
O desafio, portanto, é comprovar que a segunda premissa está errada.
Nas análises do Copom e do mercado, os econometristas limitam-se a analisar a relação Selic-PIB. Juntam séries históricas e definem correlações que, em tese, deveriam mostrar os efeitos das variações da Selic sobre o PIB no tempo e na intensidade. Ou seja, aumentando o PIB em 1 ponto percentual, o efeito sobre a atividade econômica será de xis em um prazo y.
Qual a maneira adequada de medir esses efeitos:
1. Analisar o impacto da Selic sobre o mercado de crédito.
2. Analisar o impacto do mercado de crédito sobre a variação do PIB.
Simples assim.
Definida a primeira correlação - ou seja, os efeitos da alta do crédito sobre o nível de atividade - o jogo fica mais claro. Depois, é só medir os efeitos do crédito sobre o nível de atividade, muito mais fácil de medir porque o impacto é direto.
Nesse ponto, vamos dividir os tomadores de crédito em dois grupos: o prime (a grande empresa que têm acesso às linhas mais baratas do mercado) e o não-prime (a rapa, consumidores, pequenas e médias empresas).
Ontem, o ex-economista chefe da Febraban (Federação dos Bancos Brasileiros) Roberto Troster demonstrou que não existe A MENOR correlação entre Selic e custo do dinheiro para o tomador final não-prime. Não tem novidade. Escrevo sobre isso desde que se inaugurou esse sistema de metas inflacionárias.
Se não existe nenhuma correlação da Selic com os não-prime, restariam os clientes prime para comprovar a suposta eficácia da Selic sobre o PIB.
De fato, os clientes prime são grandes empresas, cujas linhas de crédito acompanham o CDI - e, portanto, são diretamente influenciadas pela Selic. Como grandes empresas que são, dispõem de poder de mercado - isto é, de fixar preços.
Segundo a lógica do mercado, encarecendo o crédito, o aumento da Selic as obrigaria a reduzir o capital de giro, por exemplo, e com isso afetaria o nível de atividade.
Vamos conferir se essa análise é correta.
Selic e produção
Capital de giro é proporcional as vendas; e as vendas acompanham a demanda. Se a demanda (dada basicamente pelos clientes não-prime) não é afetada pela taxa Selic, não há a menor razão para reduzir a oferta. Ou as empresas absorvem essa alta do custo do dinheiro ou repassam para os preços. Na primeira hipótese, não há efeito sobre o nível de atividade; na segunda hipótese, há efeitos negativos sobre a inflação.
Selic e custo de produção
A não ser quando ocorrem variações muito substantivas na produção, o custo de um produto, na margem, equivale ao preço final menos custo dos insumos menos tributos. Isto porque não a empresa tem custos fixos (que indpendem da produção) e não mudará a folha salarial parqa variações pequenas de produção. O impacto da Selic será exclusivamente sobre o capital de giro para os insumos adquiridos.
Impacto sobre o capital de giro
Supondo uma carga tributária de 30% e uma margem operacional de 15%, a composição final de um produto seria: 15% de margem operacional, 65% de insumos e 20% de tributos. Supondo que a empresa gire seus estoques a cada 6 meses (hipótese conservadora), cada ponto da Selic impactaria o capital de giro em 0,17% (1,01 ^(1/6)). É uma porcentagem ínfima levando em conta os impactos do financiamento para os consumidores.
Impacto sobre o preço final
Como o impacto é exclusivamente sobre o custo dos insumos e supondo que eles representam 65% do preço final do produto, o impacto sobre o preço final do produto seria de apenas 0,1% (0,17 x 0,65). 6 pontos percentuais da taxa Selic (uma enormidade) teria um impacto de apenas 0,6% sobre o preço final do produto, na ponta. O que é isto perto dos 40 a 120% do custo do financiamento?
As saídas das empresas prime
À empresa prime, restariam duas alternativas para enfrentar o aumento da Selic: ou absorver ou incorporar no preço. Em ambos os casos, o efeito é insignificante. Mas existe um impacto direto nas decisões de investimento das empresas. Para investir, a empresa costuma pegar a taxa básica, acrescentar um fator de risco e estimar os resultados por prazos de 10 anos. Cada variação para cima da Selic reduz decisões de investimento.
A ata do Copom
Chegou a hora do BC submeter a Selic a testes mais efetivos, criando indicadores na ata do Copom que permitam analisar 1) o comportamento do mercado de crédito vis-à-vis a taxa da Selic; 2) o comportamento do PIB vis-à-vis a Selic. Com isso permitirá que o debate sobre política monetária ganhe substância e não seja uma ficção estatística, como é atualmente. E, abrindo a discussão, aprimorar de ftao as ferramentas de política monetária.
Entenda as contas
Preço final
100.00%
100
Margem
15%
15
Insumos
65%
65.39
Impostos
30%
19.617
Total
100.007
Impacto da Selic
Selic
Ano
6%
Giro (meses)
2
0.98%
Impacto
s/insumos
0.64
s/preco final
0.42
Margem: Margem% x preço final
Insumos: Insumos% x preço final (ajustado com impostos para chegar aos 100)
Impostos: impostos% x preço final
Selic: 1,06 ^ (1/(12/giro)) – 1
Impacto sobre insumos: 0,98 x 65,39
Impacto sobre preço final: 0,42 x 100
Imagens:
Enviado por luisnassif, sex, 03/02/2012 - 12:16
Coluna Econômica - 03/02/2012
Vamos retomar o tema da coluna de ontem.
Como funciona a política monetária:
1. A cada fechamento do dia, os bancos trocam reservas entre si para fechar a conta. A taxa de juros dessas operações é dada pelo CDI (Certificado de Depósito Interbancário) diretamente afetado pela taxa Selic, a chamada taxa básica da economia fixada pelo Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central).
2. Tornando o dinheiro mais caro no interbancário, pretende-se que a elevação de custo impacte a taxa de juros na ponta, aquela que vai para o cliente de banco.
3. Com a taxa mais cara, teoricamente o consumidor vai consumir menos, devido ao encarecimento de crédito, e a empresa vai comprar menos, devido à redução de estoques, reduzindo os preços. E vice-versa.
Vamos sintetizar o que foi exposto acima em um pequeno exercício de lógica:
1. As taxas de crédito ao tomador final impactam o PIB.
2. A taxa Selic impacta as taxas de crédito ao tomador final.
3. Logo, a taxa Selic impacta o PIB.
O ponto central é que a segunda premissa é incorreta: a taxa Selic não impacta as taxas do tomador final. Não impactando, seu impacto sobre o nível de atividade é zero, ou insignificante. Mas sobre as contas públicas é direto, desviando recursos de infraestrutura, investimentos e políticas sociais para os detentores de títulos públicos.
O desafio, portanto, é comprovar que a segunda premissa está errada.
Nas análises do Copom e do mercado, os econometristas limitam-se a analisar a relação Selic-PIB. Juntam séries históricas e definem correlações que, em tese, deveriam mostrar os efeitos das variações da Selic sobre o PIB no tempo e na intensidade. Ou seja, aumentando o PIB em 1 ponto percentual, o efeito sobre a atividade econômica será de xis em um prazo y.
Qual a maneira adequada de medir esses efeitos:
1. Analisar o impacto da Selic sobre o mercado de crédito.
2. Analisar o impacto do mercado de crédito sobre a variação do PIB.
Simples assim.
Definida a primeira correlação - ou seja, os efeitos da alta do crédito sobre o nível de atividade - o jogo fica mais claro. Depois, é só medir os efeitos do crédito sobre o nível de atividade, muito mais fácil de medir porque o impacto é direto.
Nesse ponto, vamos dividir os tomadores de crédito em dois grupos: o prime (a grande empresa que têm acesso às linhas mais baratas do mercado) e o não-prime (a rapa, consumidores, pequenas e médias empresas).
Ontem, o ex-economista chefe da Febraban (Federação dos Bancos Brasileiros) Roberto Troster demonstrou que não existe A MENOR correlação entre Selic e custo do dinheiro para o tomador final não-prime. Não tem novidade. Escrevo sobre isso desde que se inaugurou esse sistema de metas inflacionárias.
Se não existe nenhuma correlação da Selic com os não-prime, restariam os clientes prime para comprovar a suposta eficácia da Selic sobre o PIB.
De fato, os clientes prime são grandes empresas, cujas linhas de crédito acompanham o CDI - e, portanto, são diretamente influenciadas pela Selic. Como grandes empresas que são, dispõem de poder de mercado - isto é, de fixar preços.
Segundo a lógica do mercado, encarecendo o crédito, o aumento da Selic as obrigaria a reduzir o capital de giro, por exemplo, e com isso afetaria o nível de atividade.
Vamos conferir se essa análise é correta.
Selic e produção
Capital de giro é proporcional as vendas; e as vendas acompanham a demanda. Se a demanda (dada basicamente pelos clientes não-prime) não é afetada pela taxa Selic, não há a menor razão para reduzir a oferta. Ou as empresas absorvem essa alta do custo do dinheiro ou repassam para os preços. Na primeira hipótese, não há efeito sobre o nível de atividade; na segunda hipótese, há efeitos negativos sobre a inflação.
Selic e custo de produção
A não ser quando ocorrem variações muito substantivas na produção, o custo de um produto, na margem, equivale ao preço final menos custo dos insumos menos tributos. Isto porque não a empresa tem custos fixos (que indpendem da produção) e não mudará a folha salarial parqa variações pequenas de produção. O impacto da Selic será exclusivamente sobre o capital de giro para os insumos adquiridos.
Impacto sobre o capital de giro
Supondo uma carga tributária de 30% e uma margem operacional de 15%, a composição final de um produto seria: 15% de margem operacional, 65% de insumos e 20% de tributos. Supondo que a empresa gire seus estoques a cada 6 meses (hipótese conservadora), cada ponto da Selic impactaria o capital de giro em 0,17% (1,01 ^(1/6)). É uma porcentagem ínfima levando em conta os impactos do financiamento para os consumidores.
Impacto sobre o preço final
Como o impacto é exclusivamente sobre o custo dos insumos e supondo que eles representam 65% do preço final do produto, o impacto sobre o preço final do produto seria de apenas 0,1% (0,17 x 0,65). 6 pontos percentuais da taxa Selic (uma enormidade) teria um impacto de apenas 0,6% sobre o preço final do produto, na ponta. O que é isto perto dos 40 a 120% do custo do financiamento?
As saídas das empresas prime
À empresa prime, restariam duas alternativas para enfrentar o aumento da Selic: ou absorver ou incorporar no preço. Em ambos os casos, o efeito é insignificante. Mas existe um impacto direto nas decisões de investimento das empresas. Para investir, a empresa costuma pegar a taxa básica, acrescentar um fator de risco e estimar os resultados por prazos de 10 anos. Cada variação para cima da Selic reduz decisões de investimento.
A ata do Copom
Chegou a hora do BC submeter a Selic a testes mais efetivos, criando indicadores na ata do Copom que permitam analisar 1) o comportamento do mercado de crédito vis-à-vis a taxa da Selic; 2) o comportamento do PIB vis-à-vis a Selic. Com isso permitirá que o debate sobre política monetária ganhe substância e não seja uma ficção estatística, como é atualmente. E, abrindo a discussão, aprimorar de ftao as ferramentas de política monetária.
Entenda as contas
Preço final
100.00%
100
Margem
15%
15
Insumos
65%
65.39
Impostos
30%
19.617
Total
100.007
Impacto da Selic
Selic
Ano
6%
Giro (meses)
2
0.98%
Impacto
s/insumos
0.64
s/preco final
0.42
Margem: Margem% x preço final
Insumos: Insumos% x preço final (ajustado com impostos para chegar aos 100)
Impostos: impostos% x preço final
Selic: 1,06 ^ (1/(12/giro)) – 1
Impacto sobre insumos: 0,98 x 65,39
Impacto sobre preço final: 0,42 x 100
Imagens:
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