segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012


Carta do Henfil escrita a pedido do diretor Ademar Guerra para encerrar a peça Revista do Henfil, que estreou em 1978.

Eu nunca soube amar. Eu nunca soube amar a cada um. Eu nunca soube amá-los como indivíduos. ...Eu nunca soube aceitá-los como feios, fracos e lentos. Tragam-me um doente e não chorarei com ele. Mas me mostrem um hospital e derramarei rios e mares. Eu não sei falar e ouvir um homem, uma mulher ou uma criança. Eu só sei fazer coletivo, massa, povo, conjunto. Sou capaz de ser herói, mas não sou capaz de ser enfermeiro. Sou capaz de ser grande, mas não sou capaz de ser pequeno. Nunca dei uma flor. Dou desenhos, dou textos, escrevo cartas. Sem contato manual, sem intimidade, sem entregar. Por que desenho, porque escrevo cartas e agora peças? Aqui estão 14 anos de solidão. Minha arte é fruto da minha importância de viver com vocês. Abaixo esta peça! Mas juro, pela minha mãe, que não vejo a hora de pular aí e dar a minha solidariedade, a minha coragem, o meu amor a cada um pessoalmente. Um dia, vou rasgar o papel que escrevo, rasgar o bloco que desenho, rasgar até este recado covarde e vou me melar e besuntar vocês, tudo com meu grande beijo. Vocês vão me reconhecer fácil: vou ser o mais feliz de vocês.

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