Compulsório vai financiar concessões de rodovias e ferrovias

Por Assis Ribeiro
Do Valor
Compulsório vai para rodovias e ferrovias
Ribamar Oliveira
No fim do ano passado, o Banco Central alterou as regras dos depósitos compulsórios dos bancos. Ele permitiu que as instituições financeiras descontem do montante recolhido sobre os depósitos à vista os financiamentos feitos às empresas nas condições favorecidas do Programa de Sustentação do Investimento (PSI). O BC estabeleceu que o desconto poderá atingir R$ 15 bilhões. Na quinta-feira, dia 28, o Conselho Monetário Nacional (CMN) baixará norma definindo que esses recursos serão utilizados para financiar os investimentos a serem feitos pelos vencedores das futuras concessões de rodovias e ferrovias, segundo fontes do governo. O CMN definirá também as condições financeiras desses empréstimos, mas é improvável que os juros sejam de 3% como é o caso de algumas linhas de crédito do PSI.
Embora as discussões dentro do governo sobre essa questão ainda estejam em curso, a tese que prevalece no momento é que o Tesouro Nacional não cobrirá qualquer diferença entre os juros favorecidos desses empréstimos aos concessionários de rodovias e ferrovias e as taxas praticadas pelos bancos em seus empréstimos normais ao mercado. Dito de uma forma mais direta: não haverá custo fiscal para o Tesouro por conta dessas operações.
O argumento principal em defesa dessa posição é que o custo dos depósitos à vista para os bancos é zero e, portanto, se a taxa cobrada no empréstimo ao concessionário for de 5%, por exemplo, já será um ganho significativo para a instituição.
Pela primeira vez, concessão terá taxa de juros subsidiada
As taxas de juros atuais do PSI variam de 3% ao ano a 5,5% ao ano, sendo a mais baixa destinada à compra de caminhões, máquinas e equipamentos novos. Fonte oficial disse que o custo total (incluindo todos os encargos) poderá, até mesmo, ficar um pouco acima da TJLP (hoje de 5% ao ano). Mas, mesmo neste caso, ficará abaixo da taxa Selic. Haverá, portanto, um subsídio para o tomador do crédito.
A iniciativa do Banco Central foi apresentada, no fim do ano passado, como uma medida para incorporar os bancos privados no esforço do governo de alavancar os investimentos no país. Até agora, os financiamentos de longo prazo têm sido sustentados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) com maciços repasses, nos últimos anos, do Tesouro Nacional. Em 31 de dezembro do ano passado, o saldo dos empréstimos do Tesouro ao BNDES já estava em R$ 371,7 bilhões.
O uso do compulsório é uma tentativa de levar os bancos ao financiamento de longo prazo, mas há uma porta de saída. O governo entende que os depósitos compulsórios não devem ser utilizados como "funding" de empréstimos de longo prazo. No caso das concessões de rodovia e ferrovias, o prazo de amortização dos financiamentos será de 25 anos, no primeiro caso, e pode chegar a 30 anos no segundo.
Como o depósito compulsório é um instrumento de política monetária, o BC pode eventualmente ter que elevá-lo para reduzir a liquidez da economia, afetando as disponibilidades de recursos das instituições financeiras. Assim, os bancos que emprestarem aos concessionários de rodovia e ferrovia poderão repassar os financiamentos, no futuro, ao BNDES se assim desejarem.
A mudança do depósito compulsório, portanto, está relacionada com a Medida Provisória 606, editada pela presidente Dilma Rousseff na segunda-feira. Essa MP autorizou o Tesouro Nacional a subsidiar, sob a modalidade de equalização de taxas de juros, os empréstimos do BNDES para os investimentos que serão feitos pelos vencedores dos leilões de concessões das rodovias e ferrovias. Com isso, o BNDES poderá absorver os financiamentos que serão transferidos pelos bancos.
O governo entende que mesmo que os contratos de créditos sejam transferidos posteriormente pelos bancos ao BNDES, haverá um ganho importante em termos de agilidade na aprovação dos empréstimos. Isso porque as instituições financeiras terão mais rapidez na análise dos pedidos de financiamentos.
O BNDES também fará operações próprias para os concessionários de rodovias e ferrovias. No momento em que absorver os empréstimos feitos pelos bancos e quando fizer os seus próprios financiamentos em condições favorecidas, haverá um custo fiscal a ser coberto pelo Tesouro Nacional. Esse custo é dado pela diferença entre o custo total do empréstimo concedido pelo BNDES e o custo de captação do Tesouro, com a emissão de seus títulos.
O governo ainda não definiu o montante de recursos que o BNDES vai destinar ao financiamento dos concessionários de rodovias e ferrovias. A programação da instituição estatal para este ano prevê utilizar cerca de R$ 100 bilhões no PSI. Mas esse montante já foi reduzido pelas operações feitas em janeiro e fevereiro.
O programa de concessões de rodovias e ferrovias prevê investimentos de R$ 133 bilhões. Isto significa que as atuais disponibilidades do PSI não serão suficientes para financiar todos os investimentos. É bom lembrar que o PSI está previsto para acabar em 31 de dezembro deste ano, embora esse prazo já tenha sido prorrogado várias vezes. O limite para os empréstimos subsidiados do PSI é de R$ 312 bilhões e mais de R$ 230 bilhões já teriam sido emprestados. Para ampliar esse limite e o prazo do programa, o governo teria que editar nova medida provisória.
A questão central é que a presidente Dilma Rousseff decidiu, pela primeira vez, subsidiar os financiamentos destinados aos investimentos nas concessões rodoviárias e ferroviárias. Isso nunca tinha acontecido antes. Os empréstimos com juros subsidiados fazem parte, portanto, do conjunto de medidas adotadas pelo governo nos últimos dias para tornar mais atrativas as concessões de rodovias e ferrovias.
O governo já havia anunciado a ampliação do prazo das concessões das rodovias de 20 para 25 anos e das ferrovias de 30 para 35. Além disso, a amortização dos empréstimos às concessionárias de rodovias subiu de 20 para 25 anos e das ferrovias, ao que tudo indica, deverá ser elevado de 25 para 30 anos. Aceitou ainda reduzir as estimativas de aumento da demanda das rodovias, de 5% para 4%. Agora, anunciou juros subsidiados. Tudo para manter as tarifas mais baixas