O desafio da competitividade sem câmbio

Coluna Econômica - 05/03/2012
Ontem houve várias manifestações em grandes cidades contra a desindustrialização e o desemprego. Houve preocupação dos organizadores em não caracterizar o movimento como uma reação contras as medidas do governo – o plano Brasil Maior, anunciado na terça-feira – mas como um reforço.
Vai-se para a rua quando não se tem outras formas de expressão.
Nas últimas décadas, por falta de mídia, desenvolveu-se no país uma mentalidade absolutamente anti-indústria e anti-desenvolvimento. Qualquer tentativa de defesa da produção e do emprego internos era taxada como anacronismo, arcaismo, protecionismo indevido.
Por trás dessa posição, havia a hegemonia absoluta do discurso financista.
O mercado de capitais é uma grande ferramenta de desenvolvimento de um país, por permitir o remanejamento da poupança para novos setores. Mas transforma-se em enorme fator de distorções quando a política econômica é submetida a seus interesses.
Desenvolve-se, então, um discurso tendencioso, no qual juros elevados são considerados inevitáveis e gastos com saúde e educação, supérfluos. Abrem-se as comportas e permite-se o livre fluxo de capitais, privilegiando o chamado capital “gafanhoto” – aquele que invade setores ou países e não deixa nem grama nascendo.
Durante décadas, houve ganhos absurdos provenientes de operações sem nenhum risco: trazia-se capital externo, aplicava-se em renda fixa (títulos regidos pela Selic). O investidor ganhava com os juros absurdos e com a apreciação do real.
Na outra ponta, setores inteiros da economia sendo demolidos pelo encarecimento dos seus produtos, via câmbio. E essa irresponsabilidade sendo praticada no período em que a China emergiu como grande potência industrial, com seus produtos
Há dois momentos terríveis nessas duas décadas. O primeiro, no período Malan-Gustavo Franco, de 1994 a 1998, de compressão enorme do câmbio com os juros mais elevados da história. O segundo, no período Palocci-Meirelles, de 2004 a 2008, quando a taxa de câmbio apreciou-se ainda mais violentamente do que no período anterior.
Os estragos foram muitos e variados.
Agora, toca-se o barco iniciando a longa batalha de recuperação do tecido industrial.
O pacote foi amplo, mas não sistêmico. Identifica setores, oferece vantagens fiscais, na folha,em financiamentos. Todaessa parafernália, no fundo, visa contornar o grande dilema de política econômica: como desvalorizar o real e reduzir os juros sem impactar a inflação.
A desvalorização cambial é a única ferramenta de efeito imediato na proteção comercial. Abarca todos os setores, protege o mercado interno e abre perspectivas novas no mercado externo.
Justamente pelos impactos sobre todos os setores, encarecendo importados, impondo perdas patrimoniais ao investimento externo, afetando em um primeiro momento o poder aquisitivo interno (em relação aos produtos externos), a desvalorização cambial só ocorre em períodos de crise.
Agora tenta-se um feito inédito: o da desvalorização do câmbio sob controle. Só que o nível ótimo anunciado pelo Ministro Guido Mantega – R$ 1,80 – não dá nem para o começo.