Qual é o projeto para o desenvolvimento sustentável?
Enviado por luisnassif, qui, 28/06/2012 - 15:20
Por Caio Guimarães Souza
Vivemos em um período divisor de águas da história da humanidade. As mudanças induzidas pelo homem nos sistemas físicos da Terra - entre eles o clima, o ciclo da água e a biodiversidade - ameaçam crescentemente deteriorar de forma irreversível os ecossistemas e as condições de vida no planeta. O abismo social que aparta ricos e pobres vem se aprofundando no mundo e mais de um bilhão de pessoas ainda vivem abaixo da linha da pobreza [1]. A expansão em ritmo exponencial das cidades vem agravando criticamente a qualidade de vida de populações urbanas. "O atual modelo de desenvolvimento global é insustentável" [2]. É evidente que um progresso duradouro só pode provir de novos paradigmas de desenvolvimento que assegurem, ao mesmo tempo, crescimento econômico, justiça social e sustentabilidade ambiental. O Brasil, enquanto superpotência emergente abundante em população e em recursos naturais, pacífica e aberta à convivência com as diferentes raças e culturas, pode liderar o caminho para um futuro melhor para a humanidade se obtiver êxito em congregar os esforços das mais diversas esferas da sociedade.
Um projeto ambicioso de desenvolvimento sustentável só pode ser levado a cabo se formos capazes de medir com precisão o estado da economia, do bem-estar social e do meio-ambiente, de compreender a natureza e a interrelação dos seus fatores subjacentes, de avaliar o impacto de políticas sobre ele e de inferir a sua sustentabilidade. Essa é a mensagem fundamental do relatório da Comissão sobre a Medida do Desempenho Econômico e do Progresso Social estabelecida pelo governo da França em 2008 [3], que é voz importante no debate sobre como reformar os institutos de Estatística e empregar o conhecimento científico para melhor suportar a formulação de políticas. O relatório questiona a utilização do PIB como principal indicador do progresso de economias uma vez que ele não mensura a desigualdade social, a degradação ambiental ou a sustentabilidade e que a sua evolução não implica necessariamente, como demonstra o célebre paradoxo de Easterlin, o incremento do "nível de felicidade" médio das populações. O relatório do Painel de Alto Nível sobre Sustentabilidade Global da ONU publicado neste ano faz coro a tais conclusões: "para estimar os quatro pilares desenvolvimento sustentável (extinção da pobreza extrema, sustentabilidade ambiental, inclusão social e boa governança), precisamos de um novo conjunto de indicadores que se estendam muito além do tradicional PIB". O Brasil precisa investir vigorosamente em Estatística e em Ciência como alicerces da administração pública se almeja realizar plenamente as suas potencialidades.
O mesmo relatório da ONU afirma que "quatro etapas para aperfeiçoar a concepção de políticas são medir a felicidade, elucidá-la, colocá-la no centro das atenções e traduzir a pesquisa em bem-estar na elaboração e prestação de serviços": o aumento da felicidade das pessoas deve ser uma meta nacional da maior importância. O Relatório Mundial da Felicidade [4], com base em mais de 40 anos de acúmulo de conhecimento da linha de pesquisa multidisciplinar denominada Economia da Felicidade, advoga que a partir da coleta de dados sobre a satisfação com a vida em dimensões objetivas influentes no bem-estar - entre elas as condições de vida materiais, a saúde, a educação, as atividades pessoais, a participação política, as relações sociais, o meio-ambiente e a segurança (econômica ou física) - é possível canalizar investimentos para melhorar a vida de pessoas ou de grupos de indivíduos personalizadamente. Outra conclusão desse relatório é que a situação financeira deixa de ser o principal determinante da felicidade uma vez saciadas as necessidades básicas de sobrevivência. O Brasil já avançou bastante em matéria de bem-estar social, mas ainda há muito a ser feito. A evolução de nosso país em termos econômicos, sociais e ambientais vai depender em grande medida de nossa capacidade de criar um ambiente favorável à inovação nos vários setores da sociedade, aliciando governos, indústrias, empresas, universidades e centros de pesquisa, organizações, comunidades e cidadãos para trabalhar cooperativamente. Com efeito, a inovação é o processo através do qual são encontradas soluções para problemas abrangendo desde a luta contra doenças fatais até as mudanças climáticas, é a fonte essencial de melhoria de nossa qualidade de vida e da de nossos descendentes. As complicações associadas à urbanização vertiginosa e desgovernada, por exemplo, podem ser remediadas, como propõe o framework de desenvolvimento urbano que configura o conceito de "cidade inteligente", pela criação, exploração e difusão de tecnologias de informação e comunicação [5].
O desafio da sustentabilidade é talvez o mais difícil e crucial com o qual o homem já se deparou. Para enfrentá-lo em toda sua complexidade, são necessárias novas ideias, novas tecnologias, novos modos de colaboração, novas maneiras de ver o mundo. Os governos e as pessoas precisam mudar profundamente, e a transformação de uns é indissociável da dos outros. Por um lado, os governos devem buscar fomentar o bem-estar dos cidadãos e a igualdade de oportunidades; garantir uma boa governança, habilitando os cidadãos a participar dos processos de tomada de decisão em escalas local, regional, nacional e internacional; e visar o longo prazo, financiando e estimulando o desenvolvimento de infraestruturas, tecnologias e inovações sustentáveis e educando cidadãos mais engajados na vida em sociedade e mais conscientes do impacto de suas escolhas na coletividade e na posteridade. Por outro lado, os cidadãos devem se indignar generalizadamente com as injustiças e as deficiências da ordem vigente, se mobilizar para extingui-las e tomar responsabilidade pelas consequências de suas ações sobre a geração presente e as futuras. Bilateralmente, os governos e as pessoas devem se plasmar em sociedades mais abastadas, felizes, unidas, cooperativas, solidárias e preparadas para o porvir.
Eu acredito que a humanidade pode escolher as linhas gerais de seu destino e estou esperançoso de que vamos agir com sabedoria, adotando novos estilos de vida e novas formas de interação com nossos semelhantes e com nosso habitat que promovam o bem-estar geral e preservem o meio-ambiente. Quanto ao Brasil, "a tarefa das novas gerações de brasileiros é tomar este país em suas mãos para fazer dele o que há de ser, uma das nações mais progressistas, justas e prósperas da Terra" [6].
Notas bibliográficas
[1] THE UNITED NATIONS SECRETARY-GENERAL’S HIGH-LEVEL PANEL ON GLOBAL SUSTAINABILITY. Resilient People, Resilient Planet: A Future Worth Choosing. Nova Iorque: 2012.
[2] Ibid.
[3] COMISSION SUR LA MESURE DES PERFORMANCES ÉCONOMIQUES ET DU PROGRÈS SOCIAL. Rapport de la Comission sur la mesure des performances économiques et du progrès social. Paris: 2009.
[4] THE EARTH INSTITUTE OF COLUMBIA UNIVERSITY. World Happiness Report. Nova Iorque: 2012.
[5] INSEAD. Making Cities Smart and Sustainable. In: The Global Innovation Index 2011: Accelerating Growth and Development. Fontainebleau: 2011.
[6] RIBEIRO, D. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
Vivemos em um período divisor de águas da história da humanidade. As mudanças induzidas pelo homem nos sistemas físicos da Terra - entre eles o clima, o ciclo da água e a biodiversidade - ameaçam crescentemente deteriorar de forma irreversível os ecossistemas e as condições de vida no planeta. O abismo social que aparta ricos e pobres vem se aprofundando no mundo e mais de um bilhão de pessoas ainda vivem abaixo da linha da pobreza [1]. A expansão em ritmo exponencial das cidades vem agravando criticamente a qualidade de vida de populações urbanas. "O atual modelo de desenvolvimento global é insustentável" [2]. É evidente que um progresso duradouro só pode provir de novos paradigmas de desenvolvimento que assegurem, ao mesmo tempo, crescimento econômico, justiça social e sustentabilidade ambiental. O Brasil, enquanto superpotência emergente abundante em população e em recursos naturais, pacífica e aberta à convivência com as diferentes raças e culturas, pode liderar o caminho para um futuro melhor para a humanidade se obtiver êxito em congregar os esforços das mais diversas esferas da sociedade.
Um projeto ambicioso de desenvolvimento sustentável só pode ser levado a cabo se formos capazes de medir com precisão o estado da economia, do bem-estar social e do meio-ambiente, de compreender a natureza e a interrelação dos seus fatores subjacentes, de avaliar o impacto de políticas sobre ele e de inferir a sua sustentabilidade. Essa é a mensagem fundamental do relatório da Comissão sobre a Medida do Desempenho Econômico e do Progresso Social estabelecida pelo governo da França em 2008 [3], que é voz importante no debate sobre como reformar os institutos de Estatística e empregar o conhecimento científico para melhor suportar a formulação de políticas. O relatório questiona a utilização do PIB como principal indicador do progresso de economias uma vez que ele não mensura a desigualdade social, a degradação ambiental ou a sustentabilidade e que a sua evolução não implica necessariamente, como demonstra o célebre paradoxo de Easterlin, o incremento do "nível de felicidade" médio das populações. O relatório do Painel de Alto Nível sobre Sustentabilidade Global da ONU publicado neste ano faz coro a tais conclusões: "para estimar os quatro pilares desenvolvimento sustentável (extinção da pobreza extrema, sustentabilidade ambiental, inclusão social e boa governança), precisamos de um novo conjunto de indicadores que se estendam muito além do tradicional PIB". O Brasil precisa investir vigorosamente em Estatística e em Ciência como alicerces da administração pública se almeja realizar plenamente as suas potencialidades.
O mesmo relatório da ONU afirma que "quatro etapas para aperfeiçoar a concepção de políticas são medir a felicidade, elucidá-la, colocá-la no centro das atenções e traduzir a pesquisa em bem-estar na elaboração e prestação de serviços": o aumento da felicidade das pessoas deve ser uma meta nacional da maior importância. O Relatório Mundial da Felicidade [4], com base em mais de 40 anos de acúmulo de conhecimento da linha de pesquisa multidisciplinar denominada Economia da Felicidade, advoga que a partir da coleta de dados sobre a satisfação com a vida em dimensões objetivas influentes no bem-estar - entre elas as condições de vida materiais, a saúde, a educação, as atividades pessoais, a participação política, as relações sociais, o meio-ambiente e a segurança (econômica ou física) - é possível canalizar investimentos para melhorar a vida de pessoas ou de grupos de indivíduos personalizadamente. Outra conclusão desse relatório é que a situação financeira deixa de ser o principal determinante da felicidade uma vez saciadas as necessidades básicas de sobrevivência. O Brasil já avançou bastante em matéria de bem-estar social, mas ainda há muito a ser feito. A evolução de nosso país em termos econômicos, sociais e ambientais vai depender em grande medida de nossa capacidade de criar um ambiente favorável à inovação nos vários setores da sociedade, aliciando governos, indústrias, empresas, universidades e centros de pesquisa, organizações, comunidades e cidadãos para trabalhar cooperativamente. Com efeito, a inovação é o processo através do qual são encontradas soluções para problemas abrangendo desde a luta contra doenças fatais até as mudanças climáticas, é a fonte essencial de melhoria de nossa qualidade de vida e da de nossos descendentes. As complicações associadas à urbanização vertiginosa e desgovernada, por exemplo, podem ser remediadas, como propõe o framework de desenvolvimento urbano que configura o conceito de "cidade inteligente", pela criação, exploração e difusão de tecnologias de informação e comunicação [5].
O desafio da sustentabilidade é talvez o mais difícil e crucial com o qual o homem já se deparou. Para enfrentá-lo em toda sua complexidade, são necessárias novas ideias, novas tecnologias, novos modos de colaboração, novas maneiras de ver o mundo. Os governos e as pessoas precisam mudar profundamente, e a transformação de uns é indissociável da dos outros. Por um lado, os governos devem buscar fomentar o bem-estar dos cidadãos e a igualdade de oportunidades; garantir uma boa governança, habilitando os cidadãos a participar dos processos de tomada de decisão em escalas local, regional, nacional e internacional; e visar o longo prazo, financiando e estimulando o desenvolvimento de infraestruturas, tecnologias e inovações sustentáveis e educando cidadãos mais engajados na vida em sociedade e mais conscientes do impacto de suas escolhas na coletividade e na posteridade. Por outro lado, os cidadãos devem se indignar generalizadamente com as injustiças e as deficiências da ordem vigente, se mobilizar para extingui-las e tomar responsabilidade pelas consequências de suas ações sobre a geração presente e as futuras. Bilateralmente, os governos e as pessoas devem se plasmar em sociedades mais abastadas, felizes, unidas, cooperativas, solidárias e preparadas para o porvir.
Eu acredito que a humanidade pode escolher as linhas gerais de seu destino e estou esperançoso de que vamos agir com sabedoria, adotando novos estilos de vida e novas formas de interação com nossos semelhantes e com nosso habitat que promovam o bem-estar geral e preservem o meio-ambiente. Quanto ao Brasil, "a tarefa das novas gerações de brasileiros é tomar este país em suas mãos para fazer dele o que há de ser, uma das nações mais progressistas, justas e prósperas da Terra" [6].
Notas bibliográficas
[1] THE UNITED NATIONS SECRETARY-GENERAL’S HIGH-LEVEL PANEL ON GLOBAL SUSTAINABILITY. Resilient People, Resilient Planet: A Future Worth Choosing. Nova Iorque: 2012.
[2] Ibid.
[3] COMISSION SUR LA MESURE DES PERFORMANCES ÉCONOMIQUES ET DU PROGRÈS SOCIAL. Rapport de la Comission sur la mesure des performances économiques et du progrès social. Paris: 2009.
[4] THE EARTH INSTITUTE OF COLUMBIA UNIVERSITY. World Happiness Report. Nova Iorque: 2012.
[5] INSEAD. Making Cities Smart and Sustainable. In: The Global Innovation Index 2011: Accelerating Growth and Development. Fontainebleau: 2011.
[6] RIBEIRO, D. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
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