.Mercosul estuda tarifa contra enxurrada da China
Enviado por luisnassif, ter, 20/12/2011 - 11:53
Por Edson Joanni
Da BBC Brasil
Contra China, Mercosul estuda elevar tarifa externa
Paula Adamo Idoeta*
Da BBC Brasil em São Paulo
Práticas protecionistas marcam relação comercial entre Brasil e Argentina no Mercosul
De olho nos efeitos da crise econômica global, os países do Mercosul estudam elevar a tarifa externa cobrada de importados de fora do bloco como foram de evitar uma enxurrada de produtos da China.
p>O assunto terá destaque na 42ª Cúpula do Mercosul, que começa nesta terça-feira em Montevidéu e que retomará antigas discussões sobre assimetrias, protecionismo e a adesão de outros países-membros - como a Venezuela -, no cenário de crise internacional.
Na segunda-feira, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, confirmou que "está sendo discutida uma lista com cem novos itens a ser taxados com a tarifa máxima da TEC (Tarifa Externa Comum), de 35%", o que dificultaria a entrada de determinados produtos estrangeiros no bloco
"A Argentina pede 200 para impedir que entrem produtos de fora do Mercosul", disse o ministro da Fazenda.
Uma das grandes preocupações de agentes econômicos é que a China redirecione ao Mercosul os produtos que não conseguirá vender nos mercados europeu e americano, mais afetados pela crise.
'Tratado desvirtuado'
O Brasil será representado pela presidente Dilma Rousseff na reunião em Montevidéu.
O bloco de Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai completou 20 anos em 2011, com avanços políticos e crescimento das trocas comerciais de 1000% entre os quatro países, segundo o Ipea – de US$ 3,5 bilhões em 1989 para US$ 39,2 bilhões em 2010 -, mas com diversos empecilhos a serem corrigidos, na opinião de observadores e líderes políticos.
Uma das principais queixas vem dos países menores – Uruguai e Paraguai –, que alegam barreiras comerciais a seus produtos nos mercados maiores, Brasil e Argentina.
O anfitrião Uruguai, que assume a Presidência rotativa do bloco, pede "melhores condições de acesso" ao restante do Mercosul e diz ter dificuldades em exportar têxteis, livros e plástico ao Brasil, informa a agência Efe.
O protecionismo comercial também marca há anos as relações entre Brasil e Argentina, ferindo o espírito do Tratado de Assunção, que criou o Mercosul em 1991.
"O tratado foi desvirtuado, perdendo sua característica de estímulo e de eliminação de restrições tarifárias", disse à BBC Brasil Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Washington e atual presidente do Conselho Superior de Comércio Exterior da Fiesp.
Projetos como unificação monetária, fim de dupla cobrança de tarifas alfandegárias e unificação tributária andam devagar ou seguem paralisados.
Para Barbosa, as trocas multilaterais cresceram a despeito, e não por causa, do bloco comum. "O comércio cresce sem o Mercosul, com os empresários correndo por fora para aumentar suas exportações", opina.
Já José Renato Martins, professor e secretário de relações institucionais da Universidade Federal de Integração Latino-Americana (Unila), considera esse tipo de disputa comercial inerente ao processo de integração.
"O comércio gera contenciosos por natureza", diz. "Temos que valorizar os avanços expressivos no fluxo comercial. E o fato de haver um fundo público para superar essas diferenças (entre países-membros) é outro sinal de integração."
Países menores do bloco se queixam de assimetria em relação a países maiores
Martins se refere ao Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (Focem), criado em 2006 para financiar projetos conjuntos de infraestrutura com o objetivo de diminuir as disparidades entre as nações do bloco.
Nesse espírito, o Brasil contribui com 70% dos fundos, a Argentina, com 27%; Uruguai e Paraguai, com 2% e 1%, respectivamente.
Venezuela
Outro tema a ser debatido é a entrada da Venezuela, cuja adesão ao bloco foi autorizada em 2006, mas permanece emperrada no Parlamento paraguaio – que, de maioria de oposição ao governo, alega falta de garantias democráticas por parte do governo de Hugo Chávez.
O presidente do Uruguai, José Mujica, pede que a entrada de Caracas seja acelerada por uma "revisão dos critérios" do bloco. Mas a declaração foi vista por críticos como um atropelamento do tratado do Mercosul, que prevê que a adesão de novos membros ocorra só após decisão unânime dos Executivos e Legislativos dos membros atuais.
Por um lado, diz Barbosa, a eventual adesão da Venezuela serve a um objetivo "estratégico", de fazer com que o Mercosul se estenda até o Caribe. Por outro, acha que Chávez "quer o Mercosul como tribuna política".
Martins vê na Venezuela um "potencial energético" significativo, cuja adesão ao Mercosul "fortalecerá a integração regional".
Nesta terça, é esperado também um pedido do Equador para a entrada no bloco, em processo que deve ser igualmente lento.
Integração sociopolítica
Enquanto o lado comercial enfrenta contenciosos, defensores do Mercosul destacam os avanços de integração política e social do bloco.
Martins cita a própria Unila, localizada em Foz do Iguaçu e com 650 alunos de todo o continente, como um exemplo de avanços de propostas educacionais conjuntas do bloco.
E, além da livre circulação de pessoas sem a necessidade de passaporte, um brasileiro que trabalhe parte de sua vida na Argentina, por exemplo, pode ter esse período devidamente contabilizado para sua aposentadoria no Brasil.
Entrada na Venezuela no Mercosul ainda não foi aprovada por Parlamento paraguaio
Na parte política, Williams da Silva Gonçalves, professor de relações internacionais da Uerj, disse em entrevista à BBC Brasil em novembro que o Mercosul "é um projeto irreversível que eliminou qualquer hipótese de guerra no Cone Sul".
Mas, em tempos em que o principal bloco global – a União Europeia – enfrenta uma crise estrutural, e que o comércio do Brasil com a China supera exponencialmente as trocas entre Brasil e os demais países do Mercosul, os questionamentos ao bloco são frequentes.
Na última semana, um relatório do Instituto de Estudos Políticos de Paris sobre a América Latina disse que o Mercosul "é um processo de integração debilitado por profundas assimetrias de desenvolvimento", sem instituições capazes de levar em conta os interesses gerais do bloco.
Uma das instituições citadas é o Parlamento do Mercosul (Parlasul), de "atribuições modestas" em relação à tomada de decisões e ainda sem parlamentares eleitos por voto direto.
Barbosa é pessimista quanto ao futuro do mercado comum. "O Mercosul é um exercício, uma oportunidade de foto (para seus líderes), com uma parte comercial moribunda", afirma.
Martins, em contrapartida, vê o bloco como "a experiência de integração mais duradoura na região", com a ressalva de que "nenhum processo de integração é linear – avança e recua, o que é natural".
*Colaborou Denise Motta, de Montevidéu .
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