Enviado por Míriam Leitão - 27.11.2011
9h00m
Coluna no GLOBO
Ocupe ou desocupe
O presidente Obama disse várias vezes que a Praça Tahrir, no Egito, era uma inspiração para o povo americano. Quando o movimento Occupy começou a ficar mais numeroso nos Estados Unidos, a polícia desalojou os manifestantes alegando razões de saúde pública. No Egito se luta contra uma ditadura e os EUA são uma democracia, mas hoje, em várias partes do mundo, há razões para ocupar praças.
No dia 11 de fevereiro, o presidente Barack Obama disse, solene: “O povo americano está tocado por essas cenas no Cairo, por sermos o povo que somos e pelo mundo no qual queremos que nossas crianças cresçam.” Tinha caído, depois de uma heróica ocupação da praça, o governo de Hosni Mubarak que os Estados Unidos apoiaram por 30 anos. O presidente americano com o discurso estava tentando mudar, na undécima hora, a política externa dos EUA. Ainda não havia começado o movimento Occupy no país, mas logo depois começaria.
Os egípcios mostraram nos últimos dias, novamente, que podem ensinar como se ocupa uma praça. Se eles foram a fonte de inspiração para movimentos de inconformados ao redor do mundo não se sabe, mas nos EUA as autoridades têm lutado para desocupar as praças. O movimento virou uma espécie de franquia; absorve bandeiras locais contra tudo que é visto como injustiça ou opressão.
Não é o presidente Barack Obama que chama a polícia, mas sim o prefeito de Nova York, depois do devido processo legal. Em qualquer das várias cidades em que acontece é sempre caso para as autoridades municipais, que agem depois da ordem de desocupação. Mas, de qualquer maneira, o movimento de protesto contra Wall Street não parece confortável para nenhum dos dois partidos que se alternam no poder nos EUA. Ele revela falhas graves no funcionamento do sistema financeiro americano e que foi mantido pelos dois partidos.
O mundo vive há mais de três anos uma crise assustadora provocada por erros ainda não corrigidos. A crise nasceu do excesso de desregulamentação dos mercados financeiros, processo iniciado pelo Partido Republicano e mantido pelo Democrata. O excesso de liquidez e a falta de controle e fiscalização estão na origem de produtos financeiros tóxicos que se espalharam pelo mundo como se fossem bons ativos. As criaturas tinham boas notas dadas pelas agências de risco, mas quando foram dissecadas é que se descobriu do que eram feitas.
Todos acompanharam a história dos empréstimos abundantes que alimentaram o sonho da casa própria de quem não podia pagar e como isso foi produzindo a bolha imobiliária americana. Todo mundo viu também como os altos executivos e os grandes acionistas dos bancos, que tinham permitido manobras perigosas com o dinheiro dos clientes, voltaram a receber gordos bônus. Todos os contribuintes viram os rios de dinheiro que foram em direção a Wall Street, depois de evitarem Main Street. Essa contraposição entre o interesse da maioria (Main Street) e os interesses da elite do mercado financeiro (Wall Street) foi explorada por Obama durante a eleição.
Depois do dilúvio que houve no final de 2008 e começo de 2009 um grande debate estabeleceu-se no Congresso americano. Da discussão surgiu uma proposta de reforma regulatória, a lei Dodd-Frank, (Dodd-Frank Wall Street Reform and Consumer Protection Act) que tira algumas funções dos bancos, reorganiza a burocracia da regulação americana, estabelece novos controles e obrigações. Parece excelente. O diabo está nos detalhes. Nos milhares de detalhes. A lei tem 2.319 páginas e está sendo detalhada. Ficou inexequível. A ideia do lobby dos grandes bancos era exatamente essa: confundir para deixar tudo como está.
De concreto, os bancos passaram a ser regulados pelo Fed, todos eles. Os bancos de investimentos viviam sem supervisão alguma, até que quebraram. O primeiro, Bearn Sterns, foi salvo; o segundo, Lehman Brothers, afundou, criando um redemoinho que sorveu a estabilidade financeira de boa parte do mundo.
Os economistas sabem que o risco moral é alto. Os bancos continuam achando que o lucro é deles e o prejuízo é do distinto público. Os bônus continuaram sendo distribuídos para os altos executivos. E até Warren Buffet mostrou com alguns poucos números que o sistema é injusto. Buffet lembrou que ele paga menos de 17% sobre a renda tributável, mas seus funcionários pagam 30%. Provou também, por um mais dois, que as isenções de impostos para os muito ricos não criaram empregos, como os republicanos defendem. Mesmo assim, os democratas não conseguiram derrubar os rebates tributários para milionários e bilionários americanos.
Então, quem está na praça tem razão. O movimento é meio confuso, sustenta palavras de ordem terminais, como o pedido de que não haja banco central no país, mas é um sintoma claro de que há forte insatisfação. O cidadão que perdeu emprego, que não conseguiu pagar sua hipoteca e não vê a reativação da economia está aflito. Há bons motivos para protestar, principalmente se a pessoa for jovem. Seja em Nova York, São Francisco ou Cairo.
9h00m
Coluna no GLOBO
Ocupe ou desocupe
O presidente Obama disse várias vezes que a Praça Tahrir, no Egito, era uma inspiração para o povo americano. Quando o movimento Occupy começou a ficar mais numeroso nos Estados Unidos, a polícia desalojou os manifestantes alegando razões de saúde pública. No Egito se luta contra uma ditadura e os EUA são uma democracia, mas hoje, em várias partes do mundo, há razões para ocupar praças.
No dia 11 de fevereiro, o presidente Barack Obama disse, solene: “O povo americano está tocado por essas cenas no Cairo, por sermos o povo que somos e pelo mundo no qual queremos que nossas crianças cresçam.” Tinha caído, depois de uma heróica ocupação da praça, o governo de Hosni Mubarak que os Estados Unidos apoiaram por 30 anos. O presidente americano com o discurso estava tentando mudar, na undécima hora, a política externa dos EUA. Ainda não havia começado o movimento Occupy no país, mas logo depois começaria.
Os egípcios mostraram nos últimos dias, novamente, que podem ensinar como se ocupa uma praça. Se eles foram a fonte de inspiração para movimentos de inconformados ao redor do mundo não se sabe, mas nos EUA as autoridades têm lutado para desocupar as praças. O movimento virou uma espécie de franquia; absorve bandeiras locais contra tudo que é visto como injustiça ou opressão.
Não é o presidente Barack Obama que chama a polícia, mas sim o prefeito de Nova York, depois do devido processo legal. Em qualquer das várias cidades em que acontece é sempre caso para as autoridades municipais, que agem depois da ordem de desocupação. Mas, de qualquer maneira, o movimento de protesto contra Wall Street não parece confortável para nenhum dos dois partidos que se alternam no poder nos EUA. Ele revela falhas graves no funcionamento do sistema financeiro americano e que foi mantido pelos dois partidos.
O mundo vive há mais de três anos uma crise assustadora provocada por erros ainda não corrigidos. A crise nasceu do excesso de desregulamentação dos mercados financeiros, processo iniciado pelo Partido Republicano e mantido pelo Democrata. O excesso de liquidez e a falta de controle e fiscalização estão na origem de produtos financeiros tóxicos que se espalharam pelo mundo como se fossem bons ativos. As criaturas tinham boas notas dadas pelas agências de risco, mas quando foram dissecadas é que se descobriu do que eram feitas.
Todos acompanharam a história dos empréstimos abundantes que alimentaram o sonho da casa própria de quem não podia pagar e como isso foi produzindo a bolha imobiliária americana. Todo mundo viu também como os altos executivos e os grandes acionistas dos bancos, que tinham permitido manobras perigosas com o dinheiro dos clientes, voltaram a receber gordos bônus. Todos os contribuintes viram os rios de dinheiro que foram em direção a Wall Street, depois de evitarem Main Street. Essa contraposição entre o interesse da maioria (Main Street) e os interesses da elite do mercado financeiro (Wall Street) foi explorada por Obama durante a eleição.
Depois do dilúvio que houve no final de 2008 e começo de 2009 um grande debate estabeleceu-se no Congresso americano. Da discussão surgiu uma proposta de reforma regulatória, a lei Dodd-Frank, (Dodd-Frank Wall Street Reform and Consumer Protection Act) que tira algumas funções dos bancos, reorganiza a burocracia da regulação americana, estabelece novos controles e obrigações. Parece excelente. O diabo está nos detalhes. Nos milhares de detalhes. A lei tem 2.319 páginas e está sendo detalhada. Ficou inexequível. A ideia do lobby dos grandes bancos era exatamente essa: confundir para deixar tudo como está.
De concreto, os bancos passaram a ser regulados pelo Fed, todos eles. Os bancos de investimentos viviam sem supervisão alguma, até que quebraram. O primeiro, Bearn Sterns, foi salvo; o segundo, Lehman Brothers, afundou, criando um redemoinho que sorveu a estabilidade financeira de boa parte do mundo.
Os economistas sabem que o risco moral é alto. Os bancos continuam achando que o lucro é deles e o prejuízo é do distinto público. Os bônus continuaram sendo distribuídos para os altos executivos. E até Warren Buffet mostrou com alguns poucos números que o sistema é injusto. Buffet lembrou que ele paga menos de 17% sobre a renda tributável, mas seus funcionários pagam 30%. Provou também, por um mais dois, que as isenções de impostos para os muito ricos não criaram empregos, como os republicanos defendem. Mesmo assim, os democratas não conseguiram derrubar os rebates tributários para milionários e bilionários americanos.
Então, quem está na praça tem razão. O movimento é meio confuso, sustenta palavras de ordem terminais, como o pedido de que não haja banco central no país, mas é um sintoma claro de que há forte insatisfação. O cidadão que perdeu emprego, que não conseguiu pagar sua hipoteca e não vê a reativação da economia está aflito. Há bons motivos para protestar, principalmente se a pessoa for jovem. Seja em Nova York, São Francisco ou Cairo.
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