A estagnação do debate sobre a mídia no meio jurídico

Por Jicxjo
Nassif, li sua carta aberta ao ministro Ayres Britto. Permita-me tecer alguns comentários aqui, acerca do senso comum midiático no meio jurídico.
Considero, em primeiro lugar, que no pretório excelso o caso do ministro não é exceção, do contrário a lei de imprensa não teria sido revogada na íntegra, mas apenas parcialmente, preservando sua parte útil e constitucional (o capítulo sobre Direito de Resposta, no mínimo). Mas o wishful thinking pró-imprensa, catalisado pela própria parte interessada, interditou o debate minucioso, atropelado pela balbúrdia de que a lei era um instrumento de censura e autoritarismo e ponto final. Da mesma forma, não vejo muita preocupação do Supremo com a eficácia dos artigos constitucionais sobre a Comunicação Social; nesse assunto o Dr. Fábio Konder Comparato tem sido quase um pregador no deserto com suas ADOs.
Pior, vejo o problema como sistêmico entre juristas, operadores e acadêmicos do direito: formou-se um consenso dos tolos, em que o senso comum sobre o papel da mídia para a democracia e para a liberdade goza de um prestígio tal que, salvo raríssimas exceções, ninguém vê necessidade de abordá-lo cientificamente, como objeto de pesquisa jurídica empírica, que almeje compreendê-lo mais profundamente. Em seu relatório, Ayres Britto simplemente externou o fato social, o senso comum que impera sobre o tema no meio jurídico, referente a uma maneira superficial de pensar a mídia que se reproduz acriticamente.
A função social da imprensa é tomada assim como uma verdade acabada a priori, sem qualquer cotejo com a realidade, sem avaliação de sua acomodação cultural e histórica, de suas funções colaterais que transcendem a concepção teórica, idealizada. O fenômeno lembra aquela sociologia subjetivista do século XIX, preocupada em identificar a utilidade teórica de fatos sociais em vez de buscar causas eficazes de sua existência e reprodução. A opinião sobre a utilidade da imprensa, de tão repisada, é tomada como naturalmente verdadeira, definitiva e suficiente, que quando confrontada leva a reações passionais, por alguém ousar contestar "o óbvio" e seu prestígio.
A muralha conceitual é reforçada pelo perfil dogmático e corporativista do meio jurídico, que desestimula ainda mais o questionamento científico, como bem nos reporta a antropologia do direito. Conjuga-se ao fato de que no mundo contemporâneo a mídia exerce influência permanente na construção da percepção da realidade, do senso comum, inclusive do jurista; percepção que em grande parte permanece intocada por falta de reavaliação sob prisma especializado, como no caso da liberdade da imprensa, evocada como merotopos retórico, sem maiores pretensões. A visão romântica disseminada eclipsa a percepção do abuso de poder social, ou mesmo minimiza sua importância. Quando é percebido o abuso, o pensamento binário o interpreta no máximo como um preço a se pagar pelos relevantes serviços, interditando uma discussão qualitativa sobre que imprensa se coaduna com um Estado Democrático de Direito, sobre que imprensa queremos.