terça-feira, 2 de abril de 2013


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O direito de resposta nos EUA e na Inglaterra
 Enviado por luisnassif, ter, 02/04/2013 - 11:03



Por Assis Ribeiro

Do Direito Público

1 DIREITO DE RESPOSTA NOS ESTADOS UNIDOS E NA INGLATERRA

ALEXANDRE SANKIEVICZ

Nos sistemas jurídicos fundados na common law, há certa aversão ao direito de resposta. O direito americano, em sua concepção atual, considera o exercício deste direito incompatível com a primeira emenda e, portanto, inconstitucional.

A tese defendida é a de que não há diferença entre determinar aquilo que um jornal deve publicar (direito de resposta) e aquilo que ele não pode publicar (censura), não cabendo ao Estado intervir na liberdade editorial da imprensa. A tese prevalecente, nada obstante, nem sempre foi esta.

A partir de 1940, a Federal Communication Commission – agência reguladora americana – desenvolveu uma política de comunicação para as emissoras de radiodifusão intitulada de fairness doctrine. A política exigia dos concessionários o cumprimento de duas obrigações básicas: a) eles deveriam dedicar uma quantidade de tempo razoável para a cobertura de assuntos de interesse público; b) a cobertura destes assuntos deveria realizar-se de maneira equitativa, de modo a possibilitar a apresentação para o público de pontos de vista controversos. Considerando ainda a necessidade de apresentação de perspectivas distintas para o público, a FCC criou a personal attack rule na década de 60.

A regra estabelecia o dever de a emissora notificar e conferir oportunidade de resposta ao interessado sempre que fosse realizado um ataque a sua integridade, honestidade, caráter ou qualidades pessoais durante a apresentação de pontos de vista controversos em temas de interesse público.

Em 1969, a Suprema Corte Americana julgou, em Red Lion Broadcasting vs. FCC1, um caso envolvendo a constitucionalidade da fairness doctrine. Tratava-se de um jornalista que pedia a concessão de tempo livre em uma estação de rádio para responder a ataques pessoais feitos em um programa da emissora.

Na ocasião, a Suprema Corte Americana destacou que, embora a radiodifusão fosse uma plataforma tecnológica claramente coberta pela primeira emenda, diferenças na característica deste tipo de mídia justificavam certas restrições.

A fairness doctrine foi considerada compatível com a primeira emenda porque a Constituição não conferia a ninguém o direito de monopolizar os feixes de radiofrequência em detrimento de seus concidadãos. Não haveria, assim, nada na primeira emenda que impedisse o governo de exigir do concessionário o compartilhamento da faixa de frequência em certas ocasiões. De acordo com a Corte, a primeira emenda não criava qualquer santuário para o exercício da censura privada por alguém que é titular de um meio não aberto a todos em razão da escassez do espectro radioelétrico. Desse modo, caberia ao concessionário, em certa medida, conduzir-se de maneira a ser também um fiduciário da obrigação de apresentar ao público perspectivas e vozes representativas da comunidade.

Red Lion Broadcasting vs. FCC parecia legitimar um direito de acesso à mídia até mesmo mais amplo do que o direito de resposta. Porém, a Suprema Corte Americana tomou decisão em sentido oposto ao decidir o caso Miami Herald Publishing Co. vs. Tornillo2 em 1974. Cuidava-se, na ocasião, de julga-mento sobre a constitucionalidade de uma lei do Estado da Flórida que garantia o direito de resposta. Neste caso, a Corte considerou inconstitucional qualquer norma que imponha a um jornal a publicação obrigatória de algo que, do contrário, ele não publicaria. “Uma imprensa responsável é um objetivo legítimo, mas a responsabilidade da imprensa não é algo determinado na Constituição, e, como muitas outras virtudes, não pode ser legislada”3. No julgamento, a Corte Americana destacou que um jornal é mais do que um receptáculo passivo de notícias, comentários ou publicidade. A escolha das matérias que são publicadas, as decisões sobre limitações de tamanho e conteúdo, a forma de tratar assuntos de interesse público e figuras públicas – seja de maneira justa ou injusta – constitui a essência do julgamento editorial, não sendo passível de controle estatal. A liberdade de imprensa, portanto, estaria em perigo assim que o Estado começa a acreditar que pode intervir naquilo que é publicado em um jornal.

As decisões criaram duas regulamentações distintas no que concerne ao direito de resposta: uma para a radiodifusão, em razão da escassez do espectro radioelétrico, e outra para a mídia escrita, completamente livre. A diferencia regulatória não ficou isenta de censura. Os críticos de Miami Herald vs. Tornillo destacam não haver uma diferença intrínseca entre a escassez tecnológica e a escassez econômica. A imprensa atual, seja escrita ou radiodifundida, não é aberta para todos. As revistas semanais e os jornais diários de grande circulação representam uma verdadeira instituição, de modo que seria praticamente impossível para um competidor entrar neste mercado de ideias tendo em vista as barreiras econômicas. Em termos práticos, o resultado é que jornais e revistas, como as televisões e as rádios, não são abertos para todos, apenas para poucos.

Tratá-los de modo distinto em razão da escassez tecnológica não faria sentido.

Apesar das críticas, o direito americano seguiu caminho contrário. Não apenas Miami Herald Publishing Co. vs. Tornillo prevaleceu, mas a própria FCC abandonou a fairness doctrine em 1987. Segundo a Agência Reguladora, a intervenção ocasionada pela doutrina no conteúdo da programação provocava restrição desnecessária à liberdade jornalística dos concessionários e, de fato, inibia a apresentação de temas de interesse público controversos. Com o risco de se verem processados ou punidos com sanções administrativas, editores tendiam a evitar controvérsias, o que, na prática, implicava redução de perspectivas na esfera pública.

A Agência também reconheceu que a aplicação da fairness doctrine aos casos concretos colocava-a no perigoso papel de avaliar a importância e o mérito de comentários expressados nos diferentes programas de rádio e televisão, pois, para avaliar se era devido ou não o direito de acesso, caberia à Agência examinar se o comentário proferido era suficientemente importante e controverso.

Segundo a Agência, a divergência de perspectivas poderia ser alcançada pela diversidade existente no então mercado de radiodifusão, que havia presenciado um crescimento significativo de canais nas últimas décadas.

Na Inglaterra, por sua vez, não há uma lei que obrigue as empresas de mídia escrita a conferir o direito de resposta. Nada obstante, há algumas regras decorrentes da própria autorregulamentação do setor ou previstas em estatutos de empresas de mídia que reconhecem o direito. O art. 2º do Código de Práticas da Press Complaints Commission – entidade criada pelo próprio setor para autorregulação – dispõe ser oportuna a concessão de oportunidade ao interessado para responder a imprecisões divulgadas pela mídia quando isto for solicitado4.

Na radiodifusão, o Código da Ofcom – agência reguladora do setor – estabelece a oportunidade de resposta se um programa aponta falta, incompetência ou outras alegações significativas sobre uma pessoa5. O estatuto da BBC – editorial guidelines, section 5 – também estabelece o direito de resposta6. O direito de resposta na Inglaterra, desse modo, é uma obrigação legal para as mídias de rádio e televisão e uma obrigação moral para a imprensa escrita.

ALEXANDRE SANKIEVICZ

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