Os exageros no alarde do declínio francês

Por Paulo F.
Do Diário de Notícias de Lisboa
O declínio da França é manifesto exagero
por LEONÍDIO PAULO FERREIRA   23 Abril 2012
Nunca se deve usar a altura para medir a dimensão de um político francês. Napoleão ficava-se por 1,68 m, De Gaulle pairava nos seus 1,93 m e ninguém duvida da grandeza de ambos. Por isso, não depende do tamanho do seu Presidente - continue a chamar-se Sarkozy ou passe a ser Hollande - o estatuto de França como grande nação. Aliás, poucos centímetros separam os dois homens que a 6 de maio disputarão a segunda volta: se descalçar os sapatos de tacão, Sarkozy mede o mesmo que o imperador, Hollande mais cinco centímetros.
p>Convém a todos que quem mande em França tenha elevação. É que apesar das ideias feitas, o país está longe do declínio. É hoje a quinta potência económica mundial e na União Europeia só fica atrás da Alemanha.
Continua a dar cartas na investigação científica, só perdendo entre os europeus outra vez para os alemães na hora de contar as patentes, e soma prémios Nobel na última década tanto na medicina, como na física e na química.
Está também nos dez países mais medalhados nos Jogos Olímpicos, nos dez que mais livros publicam e nos dez maiores produtores de cinema, com O Artista a tornar-se a primeira película não anglo-saxónica a ganhar o Óscar de Melhor Filme. E se o francês deixou de ser a língua internacional, a verdade é que continua a ser um dos seis idiomas da ONU e são 56 os Estados que integram a Francofonia.
Por isso, quando Sarkozy faz cartazes a associar-se à imagem de "uma França Forte", não se trata só de propaganda. Mesmo Hollande, quando proclama que já Presidente tratará de inverter o modo como a Europa combate a crise do euro, sabe que só o líder de um grande país pode falar assim sem cair no ridículo.
O errado quando se descreve a França como decadente é insistir na comparação com o passado: sim, já não possui o poderio da era de Luís XIV ou a pujança que se seguiu à Revolução de 1789. Mas os britânicos também já não têm um império onde o Sol jamais se põe e os Estados Unidos veem a liderança ameaçada por uma China sedenta de reconquistar o seu lugar na ordem natural das coisas.
Na Europa, só com a Alemanha a França tende a perder na comparação. Mas até tem uma vantagem discreta que a favorece a prazo. É que enquanto a população alemã diminui, as francesas são das raras a ter dois filhos, homenagem aos tempos em que o país era o reservatório de gente do continente (onde é que pensava que Napoleão foi buscar tantos soldados?). Claro, os imigrantes contribuem, mas a capacidade de assimilação é bem melhor do que aquilo que grita a extrema-direita: olhe-se para os candidatos presidenciais: Sarkozy tem pai húngaro, Mélenchon avós espanhóis, Joly nasceu norueguesa. E se não há lusodescendentes na corrida, note-se que o embaixador em Lisboa é um Teixeira da Silva.
Já que se fala de diplomacia, há ainda o direito de veto na ONU como ferramenta do poderio da França, país que é também o quinto exportador de armas e que, conjugando as duas vertentes, foi decisivo para a queda de Kadhafi . E no campo económico a França pode também contar com outro tipo de embaixadores. Um inquérito na China pôs quatro marcas de luxo francesas como as mais desejadas. À frente, a Louis Vuitton, que pertence a Bernard Arnault, o mais rico dos europeus.
Mark Twain dizia há mais de cem anos que "a França tem habitualmente sido governada por prostitutas". Como muitos americanos, não apreciava o país nem os seus políticos. Mas até o escritor reconheceria que as notícias do declínio são manifestamente exageradas.