terça-feira, 16 de outubro de 2012

Sobre o racismo nas obras literárias
Enviado por luisnassif, ter, 16/10/2012 - 09:43
Por Almeida
Comentário ao post "O debate sobre o racismo na obra de Monteiro Lobato"
Weden,
Cuidado. Obscurantismo não se combate com a luz de fogueiras de livros; a noite iluminada por essas fogueiras inaugurou, o lado mais obscuro da história.
Onde é que na literatura infantil de Lobato se encontra o trecho que você cita, "Um dia se fará justiça ao Ku Klux Klan; etc..."?  Onde é que existe, na mesma literatura para crianças, a defesa de castração de negros? Por que banir das escolas públicas, toda literatura infantil de Lobato, a partir das obras e escritos que ele dirigiu para adultos?
Se você quer que o dinheiro público não adquira a obra de Lobato, então, ele deve ser banido de toda biblioteca pública, o que inclui as universitárias. Mas se racismo é motivo, de não aquisição de obra racista com dinheiro público, por "uma questão de coerência", a probição terá de alcançar muito além das obras de Lobato.
Vejamos Os Sertões, uma das principais obras literárias da nossa língua e de fundamental importância para entender o Brasil. Toda teoria eugenista está ali contida, no capítulo que Nelson Werneck Sodré classificou de "as catacumbas de Euclides da Cunha". Se houver impeditivo do dinheiro público para não comprar obra racista, então Os Sertões ficará de fora das bibliotecas e das universidades públicas. Mas não somente essa obra.
Racismo é um fenômeno social e histórico, impregna a literatura universal. Nem a bíblia escapa, o que existe ali de xenofobia, de pregações genocidas e racismo não está no gibi; está lá mesmo, no Velho e no Novo Testamento. Até o Cristo pisou na jaca do racismo. Diante da mulher cananéia  que lhe implorava compaixão, disse aos discípulos, que não fora enviado senão às ovelhas da casa de Israel, e para a mulher disse, que não era bom tomar o pão dos filhos e lançá-lo aos cães. Precisou a "cadela" suplicar pelas migalhas da graça, "mostrar fé", senão continuaria a ser tratada como tal.
Você pergunta sobre aquisição pública de obra antissemita. Eu compraria sim. Lembro-me de uma visita que fiz à casa de uma jovem amiga judia. Notei uma edição do Mein Kampf em sua estante, não resisti e lhe indaguei. Ela me respondeu que ganhara do pai na adolescência, com a recomendação de conhecer e poder ensinar aos seus filhos, o exato conteúdo, daquilo que ela e eles deveriam combater nas suas vidas. Esse episódio reforçou em mim, a convicção de algo que aprendi desde a primeira cartilha; o ensinamento de amar e preservar o livro. Sempre vi, na imagem dos que desejam queimar e banir livros, o obscurantismo da inquisição e do fascismo. A preservação daquele livro na estante de minha jovem amiga representava um propósito, o combate às trevas do racismo.
Cuidado também com a judicialização da vida pública. Começou com criminalizações de movimentos sociais e rapidamente, visto em episódio recente, se estendeu para a política. Levar ao supremo tribunal político uma obra literária, sob acusação de racismo, têm implicações maiores. Racismo pelas nossas leis é crime, um veredito pode tornar a obra criminosa diante lei e, portanto, proscrita como tal, o que implicaria em sua retirada, pois não faria sentido permitir a circulação do crime, mesmo restrita. O precedente da legitimação da censura ficaria aberto, toda criação literária ficaria refém de nihil obstat judicial. Vamos discutir a questão no terreno político, deixemos a judicialização de lado.
Saudações.

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